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Entrevistas e dicas de espetáculos

Entrevista com o ator Renato Borghi
Publicado em 20/01/2016, 10:00
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Renato Borghi e Elcio Nogueira Seixas estão em cena no clássico Fim de Jogo, de Samuel Beckett, com direção de Isabel Teixeira

Fim de Jogo celebra os 20 anos de atividades ininterruptas do Teatro Promíscuo; companhia nascida da parceria entre os atores Renato Borghi e Elcio Nogueira Seixas.

A peça é encenada no apartamento de Renato Borghi, onde o ator reside desde 1957, localizado na região da Avenida Paulista.

Na trama, o velho Hamm (Renato Borghi) está cego e paralítico, Clov (Elcio Nogueira Seixas) não pode sentar-se, Nagg (Adriano Borghi) e Nell (Maria de Castro Borghi), pais de Hamm, também têm limitações. Todos habitam o mesmo lugar e são refugiados de uma terra devastada.
Temporada até 28 de fevereiro de 2016, sempre de quinta a domingo, às 20h00.

Os ingressos gratuitos devem ser retirados com uma hora de antecedência no Itaú Cultural. Endereço de saída e retirada de ingressos: Av. Paulista, 149. Tel: (11) 2168-1777. Capacidade: 30 lugares. Duração: 1h45min.

Renato Borghi fala sobre a importância de Beckett hoje, sobre o projeto e o processo de criação do espetáculo.

Um privilégio acompanhar a carreira de Borghi, um dos nossos grandes atores (são 57 anos de dedicação ao teatro!), e a trajetória do Teatro Promíscuo.

Vale ressaltar, Renato fala sobre si mesmo na terceira pessoa porque ele fala em nome de todo o corpo criativo. Não alterei as falas para não correr o risco de mudar, sem querer, o sentido das respostas.


ENTREVISTA:
Nanda Rovere: Qual a importância de se montar um clássico de Beckett nos dias de hoje?
Renato Borghi: Beckett é como Shakespeare ou Tcheckov; trabalha com os fundamentos da vida humana. Pode e deve ser montado sempre que um artista tenha necessidade de tornar públicas, mais uma vez, as ideias do autor, quando só ele expressa de forma precisa o que se tem a comunicar. No caso, após as cirurgias sucessivas de Borghi em sua coluna vertebral e depois de ver suas radiografias, queríamos falar do "osso" da vida, o que ela tem de mais elementar, estrutural e inescapável. Beckett é nosso Raio X. Então, é isso: queremos radiografar a nós mesmos e ao público; mostrar nossas caveiras. Em uma época em que as pessoas se enxertam substâncias para não perceber seus esqueletos e sua mortalidade, parece que FIM DE JOGO traz uma provocação oportuna.

NR: E a ideia de encenar a obra no seu apartamento, como surgiu?
RB: A ideia foi um fruto coletivo (Bel, Renato, Elcio e Lucas Brandão, diretor assistente) e gestado pelas circunstâncias. Sempre tivemos a intenção de aproximar o texto de nossas vidas e da vida do público, ao contrário das convenções "pós-segunda guerra" que sempre estiveram associadas à maioria das montagens de FIM DE JOGO. Mas a escolha do apartamento, apesar de ser a mais perfeita tradução da familiaridade distorcida proposta pelo autor, foi consequência de uma série de negativas recebidas pelo projeto nos seus primórdios: primeiro, pensamos em fazer em um elevador de carga (ou de palco) de um teatro, porém, nos demos conta rapidamente que esse tipo de equipamento é raríssimo no Brasil; depois, pensamos em colocar o público junto conosco no palco de um grande teatro (ainda com a ideia de aproximar o público de nossa arte/realidade), mas as salas que consultamos não aceitaram perder receita retirando o público do espaço convencional da plateia, nem em horários alternativos. Houve casos em que aceitaram, mas queriam cobrar uma fortuna por isso.
Em um determinado momento, percebemos que, se quiséssemos fazer a peça da forma como tínhamos imaginado, precisaríamos radicalizar. Como já estávamos ensaiando no apartamento, pensamos: "por que não aqui? já aconteceu tanta coisa teatral neste lugar, tantos artistas já passaram por aqui, peças e companhias nasceram aqui (o contrato de aluguel do Teatro Oficina foi assinado neste imóvel); enfim, o apartamento está impregnado do nosso teatro, da nossa presença, da nossa rotina, que foram os impulsos iniciais da montagem. então, por que não aqui?". Depois, chegamos à conclusão de que fazer a peça no apartamento também é um manifesto de vida, vontade e ação diante das condições precárias e primitivas da produção cultural no Brasil. Em resumo: o apartamento é uma plataforma de observação daquilo que o cotidiano tem de cruel, necessário e até reconfortante.

NR:Neste sentido, fale um pouco da concepção da encenação, já que o lugar onde a ação está ambientada traz objetos do apartamento, a lembrança dos seus pais e, consequentemente, aspectos do seu cotidiano?
RB: Para melhor compreensão da opção radical por situar a ação na própria casa do Borghi (ou em seu simulacro), é importante atentar para a sinopse da peça:
“O velho Hamm (Renato Borghi) está cego e paralítico. Seu parceiro Clov (Elcio Nogueira Seixas) tem uma estranha enfermidade que o impede de sentar-se. Junto deles, habitam outros dois mutilados, Nagg e Nell, pais de Hamm, que vivem dentro de latas de lixo. Os quatro personagens dividem um abrigo, refugiados de uma terra devastada, que Clov espia com uma luneta através de pequenas escotilhas. Não há pistas sobre que espécie de apocalipse criou tamanha desolação. No jogo da sobrevivência, Hamm dá as ordens, enquanto Clov cuida da cozinha e outras questões de ordem prática. A peça começa quando o jogo se aproxima do fim. ”
Os atores estão literalmente isolados no verdadeiro “Bunker" de Borghi, seu apartamento. As demais criaturas da peça, Nagg e Nell, nesta versão, podem ou não ser fruto da imaginação ou do esquema viciado da relação de Hamm/Clov. Portanto, também serão interpretados pelos dois únicos atores em cena, ou melhor, por seus personagens, Hamm e Clov. A ideia de concentrar o conflito apenas nos dois atores/personagens principais foi sugerida pela primeira versão da peça, conhecida como “Avant Fin de Partie”, disponível apenas para leitura nos arquivos de Beckett, que se encontram em Reading, Inglaterra (estranhamente, toda a obra do autor está armazenada no Museu Rural da pequena cidade universitária, o que soa como mais uma das bizarras piadas de Beckett).
A diretora Isabel Teixeira esteve pessoalmente no local e pôde transcrever os restritos documentos relacionados a este ponto de partida para FIM DE JOGO. Em conformidade com a intuição inicial da direção, em “Avant Fin de Partie”, só existem os dois personagens que dariam origem a Hamm e Clov. Os outros seres que aparecem na trama, como a mãe de Hamm, por exemplo, são interpretados por Clov, em um reforço do jogo entrópico que se estabelece entre os protagonistas. Partindo-se desta referência e mesclando-a com o fato de que o apartamento em questão foi habitado pelos pais de Renato Borghi desde 1957, chegou-se à conclusão de que os pais de Hamm, dentro desta lógica, só poderiam ser os pais de Borghi, Sr. Adriano Borghi (industrial) e Sra. Maria de Castro Borghi (dona de casa). Os dois já faleceram há muito tempo, mas suas fotos ainda espreitam pela casa. Portanto, as fotos dos pais mortos de Renato são o veículo utilizado pelos atores para dar vida aos pais de Hamm, Nagg e Nell. Por mais inusitado que isso possa parecer em um primeiro momento, o contexto determinado pelo apartamento real torna essa espécie de “ressurreição” teatral, ou “sessão espírita” cênica, uma extensão natural, quase inevitável, da encenação proposta.
A descrição acima ilustra bem os principais objetivos desta montagem: romper com a visão convencional atrelada ao clássico de Beckett, onde as personagens são mostradas como seres exóticos, expressos pelos atores, muitas vezes, de maneira estritamente formal, fazendo-os pertencer a um mundo distante, quase extraterreno, em que pouco de humano se pode reconhecer. Este clichê vanguardista pós-segunda guerra mundial já expirou seu prazo de validade e costuma transmitir aos espectadores nada além de alienação e tédio. O mundo contemporâneo exige a restituição do status de “pessoas” aos seres criados pelo autor irlandês. Mutilados, sim. Mas, de acordo com a visão sombria e abrangente da peça, quem não é? Afinal, o YouTube está aí para provar que não há nada tão estranho que não possa ser humano.
Não faz o menor sentido dizer ao público: “isso não é com você; são apenas criaturas amputadas movendo-se em um pós-apocalipse abstrato. Veja que sorte você tem por não ser assim, tampouco o mundo. ” Só estilhaçando com esta visão museológica da peça será possível resgatar também o público para uma verdadeira reflexão sobre si, sua casa, suas relações, seu cotidiano e o mundo que vê através de suas janelas. Outra entidade sequestrada pela solenidade do excesso formal a ser resgatada é o humor único e dilacerante presente na obra de Beckett, uma de suas principais estratégias de empatia e comunicação com a plateia. Em FIM DE JOGO, Nell exclama: “Não há nada mais engraçado que a infelicidade. ” Ou compreende-se isso ou não se compreendeu nada.

NR: Fale da retomada da parceria no projeto. Pela trajetória de vocês (e é nítido que têm o mesmo pensamento sobre o papel do teatro),qual o papel do teatro hoje?)
RB: O papel do Teatro é sobreviver apesar de tudo. Já é um grande papel após uns 2500 anos de história (idade só do Teatro como o conhecemos, naturalmente, pois seus primórdios são muito mais ancestrais). Dito isto, nós artistas também tentamos sobreviver e compartilhar esta experiência com os outros sobreviventes desta vida sem explicação. Nos divertimos, filosofamos, discutimos política, choramos, ficamos com depressão, tesão, etc. O que fazemos na vida, fazemos no teatro, mas fazemos intencionalmente e coletivamente.

NR: De que maneira o cotidiano dos personagens retrata aspectos da vida do artista e de todos nós?
RB: Se o artista acorda, escova os dentes, toma café, vai ao banheiro, rega as plantas, deixa comida pro gato, vai trabalhar, toma uma cerveja com os amigos, discute com o parceiro, depois transa com ele, ou não; enfim, se o artista faz isso tudo que todos fazem, são todos personagens desta obra.

NR: Mesmo com tanta desesperança ainda dá para contar com um mundo melhor ou estamos num ¨fim de jogo¨?
RB: Como já dizia Beckett: "O fim está no começo e, no entanto, continua-se". A vida é assim mesmo, sempre foi e seguirá sendo, portanto, não há porque se desesperar. O que não significa que não se deva agir, criar. "Mundo melhor" ou "Fim do mundo" soam mais como o velho messianismo de sempre. Na peça, há uma fala interessante: "Me disseram, o lugar é aqui, pare, levante a cabeça e repare quanto esplendor, quanta ordem".

NR: Como a trilogia Molloy”, “Malone morre” e “O Inominável”, que vocês utilizaram como fonte de investigação em 1999, serviram de base para a montagem?
RB: Aprendemos tudo sobre Beckett nesta oficina iluminada que fizemos na Oswald de Andrade sob orientação do Fábio de Souza Andrade (tradutor de Fim de Jogo). Lemos tudo que havia disponível, descobrimos novas peças e livros, trabalhamos em várias áreas de criação: Espaço, com Marcos Pedroso (Simone Mina surgiu para nós como participante desta oficina); Som, com Cacá Machado (ele criou uma ópera no escuro) e Interpretação, com Elcio, Bel, Vadim Nikitin e supervisão do Borghi. Desenvolvemos o conceito de "lampejo", que seria um rasgo de vazio e falta de sentido invadindo ações cotidianas. Principalmente, compreendemos que Beckett não estava distante de nós (como quase sempre víamos nas montagens de suas peças): ele estava dentro de nosso DNA.

NR: Qual a expectativa com relação a esse trabalho visto que ele comemora os 20 anos do Teatro do Promíscuo e os seus 60 anos de carreira?
RB: Nossa expectativa é carregar este apartamento nas costas por todo o Brasil, pelo mundo, exibindo nossa arte e nossos problemas inconfessáveis publicamente e sobreviver desta exposição indecente nesta época de crise. Pra nós, é uma peça-guerrilha para rirmos e comermos nos dias difíceis que virão. Melhor que o apartamento seja usado assim do que para pagar o plano de saúde.

NR: Proporcionar ao público ingressos acessíveis sempre foi uma preocupação do Teatro do Promíscuo. Além das apresentações gratuitas com o apoio do Itaú, o projeto prevê a gratuidade do ingresso nos outros espaços em que a peça será encenada?
RB: Sempre que nos permitirem (ou seja, nos pagarem, pois vivemos disto) e quando a gratuidade for pertinente (nem sempre é o caso, pois ensinar as pessoas a pagarem por Teatro é tão importante para formar plateia quanto oferecer espetáculos gratuitos à população), assim o faremos. No caso desta peça, a pertinência da gratuidade se caracterizou desde o início como o caminho mais adequado, já que a peça aconteceria em um imóvel privado, para poucas pessoas. Além disso, Beckett ainda precisa de incentivos para ser apreciado além dos círculos intelectuais.
A gratuidade vai contribuir para que pessoas que jamais teriam contato com o autor se aventurem a experimentá-lo. Esperamos fazer nos CEUs da periferia. Seria um desafio fantástico. E também na garconiére do Oswald de Andrade no centro da cidade, que o Secretário Municipal de Cultura, Nabil Bonduki, está querendo transformar em espaço cultural. Renato Borghi, Oswald e Beckett farão uma orgia tropicalista neste templo modernista dedicado aos mistérios gozosos. E é quase certo que faremos uma temporada popular no Sesc Vila Mariana, onde o apartamento será completamente reproduzido como se fosse um estúdio de televisão.

Para conhecer a trajetória do artista, alguns links interessantes:
Biografia de Renato Borghi – – Borghi em Revista
Coleção Aplauso. Escrito por Elcio Nogueira Seixas
http://aplauso.imprensaoficial.com.br/edicoes/12.0.813.446/12.0.813.446.pdf
http://teatropedia.com/wiki/Renato_Borghi
http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa109281/renato-borghi


Corpo Criativo:
Autor: Samuel Beckett
Tradução: Fábio Rigatto de Souza Andrade
Elenco:
Renato Borghi (Hamm)
Elcio Nogueira Seixas (Clov)
Maria de Castro Borghi (Nell)
Adriano Borghi (Nagg)
Direção: Isabel Teixeira
Direção de Arte: Karlla Girotto
Iluminação: Alessandra Domingues
Trilha Sonora: Aline Meyer
Diretor Assistente e “O Ponto”: Lucas Brandão
Assistência de Direção de Arte: Gabriela Cherubini
Assistência de Iluminação: Laiza Menegassi
Direção de palco: Tiago Moro
Filmagem e Edição: Eliana César
Midias Sociais: Roberta Koyama
Fotos: Roberto Setton e Patrícia Cividanes
Programação gráfica: Patrícia Cividanes
Assessoria de Imprensa: Adriana Monteiro
Produção Executiva: Anayan Moretto
Produção: Henrique Mariano
Realização: Teatro Promíscuo
“Este espetáculo tem seus direitos autorais licenciados pela ABRAMUS – Associação Brasileira de Música e Artes”.
Vídeos de divulgação:
https://www.facebook.com/fimdejogoteatro/?fref=ts
https://www.youtube.com/watch?v=zPyqWJDkKCE&feature=share
https://www.youtube.com/watch?v=rpuwfPzhcqQ
https://www.youtube.com/watch?v=Mhie3phsda0
https://www.youtube.com/watch?v=Ce0Bk6_H2PE
https://www.youtube.com/watch?v=Y5BO3fX26hU

Serviço:
Fim de Jogo
Com Renato Borghi e Élcio Nogueira Seixas
Estreia em 14 de janeiro de 2016
Data: de quinta a domingo – 14/01 a 28/02 / 2016
Horário: 20h00
Duração: 105 minutos
Capacidade: 30 lugares
Local: A 10 minutos a pé da sede do instituto Itaú Cultural
Inscrições a partir das 19h00, para retirada do mapa e encaminhamento para o local da apresentação - Av. Paulista, 149 - Tel: (11) 2168-1777
Classificação Indicativa: 18 anos
Temporada até 28 de fevereiro de 2016, sempre de quinta a domingo, às 20h00.
Clique nas imagens para ampliar:



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DE OLHO NA CENA BY NANDA ROVERE - TUDO SOBRE TEATRO, CINEMA, SHOWS E EVENTOS Sou historiadora e jornalista, apaixonada por nossa cultura, especialmente pelo teatro.Na minha opinião, a arte pode melhorar, e muito, o mundo em que vivemos e muitos artistas trabalham com esse objetivo. de olho na cena, nanda rovere, chananda rovere, estreias de teatro são Paulo, estreias de teatro sp, criticas sobre teatro, criticas sobre teatro adulto, criticas sobre teatro infantil, estreias de teatro infantil sp, teatro em sp, teatros em sp, cultura sp, o que fazer em são Paulo, conhecendo o teatro, matérias sobre teatro, teatro adulto, teatro infantil, shows em sp, eventos em sp, teatros em cartaz em sp, teatros em cartaz na capital, teatros em cartaz, teatros em são Paulo, teatro zona sul sp, teatro zona leste sp, teatro zona oeste sp, nanda roveri,

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