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Entrevistas e dicas de espetáculos

Entrevista com a atriz Valéria Arbex, em cartaz com o espetáculo Salamaleque
Publicado em 3//02/2016, 23:00
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A atriz Valéria Arbex foi presenteada com cartas trocadas entre seus avós, Nadime e Nicolau, imigantes sírios que se casaram aqui no Brasil.

Depois da morte da avó, Valéria e a sua irmã ganharam as cartas de presente de sua mãe. Desde então, a atriz carregou o desejo de transformar os conteúdos das cartas, e as suas memórias familiares, em um espetáculo teatral.

A atriz, com a colaboração de Alejandra Sampaio, transformou essas cartas na peça Salamaleque.

Em cena, Valéria é Elizete, que, enquanto prepara quitutes para uma celebração especial, compartilha com o público, num clima informal, a história de sua família, com pitadas de ficção e muita emoção.

Depois da apresentação, o público é convidado a degustar os quitutes preparados.

O espetáculo é parte do Projeto Terceira Margem III e estará em temporada gratuita, com três sessões por final de semana, até 12 de março. Quem for assistir poderá fazer doações a instituições de ajuda humanitária a refugiados.

Um espetáculo singelo, sensível e que valoriza os laços familiares e a história de um povo que no momento está passando por um momento muito difícil.

Mais informações no link:
http://www.deolhonacena.com.br/index.php?pg=3a1b&sub=12#linha

ENTREVISTA:

Nanda Rovere - Quais as lembranças que você tem da convivência com os seus avós e bisavós? Qual o legado que eles te deixaram?
Valéria Arbex - Conheci apenas a minha avó Nadime, com quem convivi até os meus 14 anos. Ela era muito presente na minha vida. Cuidamos dela até a sua morte, na década de 90. Sempre tive muita curiosidade em relação a sua vida no Oriente Médio; a língua materna, os costumes árabes eram assuntos constantes das nossas conversas; sempre perguntei muito sobre a vida dela lá, em Yabroud. A cultura árabe me fascinava, e a minha curiosidade só cresceu. A grande herança deixada são os laços familiares, a importância de estar perto de quem se ama-digo isso no sentido amplo, amigos, que são nossa família também - e o encontro, a convivência, o contato de fato, as conversas ao redor da mesa. Isso está presente no espetáculo.

NR - Neste sentido, a descoberta das cartas mudou (de alguma maneira)a sua visão sobre eles e sobre a sua origem?
VA - Não mudou. Sempre soube que minha vó Nadime era geniosa, e bem humorada, fazia birra nas cartas, ela era bem avançada para a sua época. E meu avô Nicolau era um poeta, que iniciava as cartas com versinhos e juras de amor. As cartas contribuíram para que eu compreendesse mais o meu avô, que não conheci. Nesse sentido, a arte permite sublimar e refazer alguns hiatos que a vida deixa, como a saudade da minha avó Nadime e a ausência do meu avô Nicolau.

NR - Fale um pouco sobre o processo de criação do personagem (esse limite tênue entre realidade e ficção nessa obra e viver em cena uma história tão pessoal). O que é real, o que é ficção?
VA - Muitas passagens do texto são as minhas próprias histórias familiares, que colhi com minha mãe, primos e pessoas da família. Fiz uma pesquisa de campo com imigrantes da região do Saara no Rio de Janeiro, voltei para a cidade do meu bisavô Neif, li muitas biografias de imigrantes, teses de doutorado sobre imigração árabe. Todo esse material foi reunido, alguns termas e histórias escolhidos. Em seguida, a Alejandra escreveu o texto, sempre em diálogo comigo. E finalizou o primeiro tratamento. Em seguida, o Kiko Marques fez o segundo tratamento, pois era um texto longo.Kiko aparou as arestas e costurou o texto com ficção também. A graça é que o público entra na história de Elizete e que tudo se mistura, somado à imaginação do espectador e à sua própria memória afetiva, vinculada à sua cozinha da infância.

NR - Fale também sobre a dramaturgia da Alejandra Sampaio, a direção da Denise Weinberg e do Kiko Marques, e essa maestria do contar história com um contato tão próximo com o público.
VA - A dramaturgia dos autores foi muito livre e dialogada comigo. Mantiveuma conversa constante com a Alejandra, e posteriormente, com Kiko. Eu tinha alguns desejos de cenas e temas que foram atendidos, mas sempre com o olhar dos dramaturgos. As atuações do Kiko e da Alejandra foram em momentos distintos, cada um teve a sua liberdade para criar o texto. Isso foi genial, pois ao mesmo tempo em que os dois escreveram um único texto, eles trabalharam separadamente com um respeito enorme na criação de cada um.
A direção também foi compartilhada e poucas vezes tive os dois diretores juntos. Foi um trabalho de diálogo entre os dois, por meio da minha atuação. A interpretação tão próxima do público foi cuidadosamente trabalhada, a palavra, a delicadeza e as transições que o texto exige. Kiko e Denise tiveram um lindo encontro também, ao dividirem a direção. Muito respeitosa a relação deles, que aprenderam um com o outro e dialogaram para a criação do Salamaleque.

NR - E a ideia de ambientar a história na cozinha, com a preparação dos alimentos para um evento especial? Mesmo diante das diferenças culturais pelo que dá pra ver assistindo ao espetáculo éque a culinária sempre une as famílias (de todas as nacionalidades!)...
VA - Sim, a cozinha, a memória afetiva, arquétipos como a avó, o doce da infância pertence a todos os povos, de todas as ascendências. Por isso, constatamos a identificação do público de todas as idadese descendências. A cozinha é um local de lembranças que habitam a memória de todos nós. Pude constatar nas entrevistas que realizei que a culinária é a principal resistência de costumes do imigrante, muitas vezes eles não voltam para a sua terra, perdem a língua materna, mas a comida é o que se perpetua de geração para geração.

NR - Você preserva tradições árabes seu dia a dia? Qual a sua relação com essa cultura, especialmente a Síria (o que mais te encanta)?
VA - A comida é o fator mais presente no meu dia a dia, sempre tem um prato da culinária árabe. Minha relação se limita às coisas que leio, escuto;fiz aula de árabe, dança do ventre para o espetáculo. Vi muitos filmes, enfim, sou uma curiosa. Acredito que alimentar,receber umas pessoas em casa, por a mesa, é o meu lado mais árabe.

NR - A cultura árabe é super rica e complexa, principalmente devido à questão das mulheres e às crenças religiosas. Qual é a sua visão sobre esse assunto? Falamos sobre o olhar ocidental que muitas vezes gera preconceitos e equívocos...
VA - Ao mesmo tempo em que o Brasil assimilou os costumes e a cultura árabe, trazida pelos imigrantes, principalmente pela culinária, o Oriente Médio e a questão do Islamismo aindageram equívocos e confusões. Somado a isso, o poder da mídia contribui para esse equívoco, pois muitas vezes associa o árabe à intolerância. A cultura árabe é ampla, rica e antiga. Seria tão bom se o aprofundamento e o estudo fossem as principais fontes de conhecimentos, e não a superficialidade dos meios de comunicação,que muitas vezes só contribuem para a desinformação. Depois dos atentados dos EUA, e os mais recentes em Paris, vejo a necessidade de falar e falar sobre esse equivoco, e colocar os pingos nos is¨. O povo árabe e o Islamismo não estão relacionados com a intolerância. Esse olhar se estende aos refugiados que se espalham pelos países na tentativa de refazerem a sua vida. Qual é o nosso olhar diante da guerra na Síria? Qual o nosso olhar para os refugiados que estão chegando ao nosso país? Essa reflexão também é fundamental e tratada no nosso espetáculo.

NR - Como foi a sua experiência em Marrocos? A sua visão sobre o país mudou após essa visita?
VA - Eu conheci Tanger, em Marrocos, país que visitamos com o Salamaleque, em 2014, quando participamos do Festival Internacional de Teatro de Tanger. Muitas imagens que faziam parte do meu imaginário foram vividas lá. Ir para uma país árabe foi uma experiência impactante. A língua, as cores, os costumes, a comida. Vivi tudo em intensidade. A cidade dos meus avós ainda não conheço. Espero que a guerra chegue ao fim, para que eu possa visitar Yabroud, onde tudo começou.

NR - A guerra na Síria... fui pesquisar detalhes sobre o país e as notícias são da guerra, pouco encontrei sobre os aspectos culturais e sociais... na mídia já divulgaram que o presidente sírio, Bashar Al-Assad, luta contra cerca de mil grupos rebeldes e ainda tem a presença do Estado Islâmico e os ataques na França, que, segundo o presidente François Hollande, foram arquitetados na Síria. (Você tem contato com parentes que residem lá, um contato que lhe dá subsídios para saber se o que estão divulgando é verídico?)
VA - A guerra na Síria é um assunto complexo, que tem muitos lados e interesses. Muita ganância pelo poder. A Síria é o único país do Oriente Médio que tem fronteira direta com o deserto,uma ampla área, onde está a riqueza natural de petróleo. É uma guerra dentro da guerra. É interesse de outros países que essa guerra continue. Afinal, numa guerra alguém sempre ganha. Os países que investem também ganham, os EUA ganham, seus aliados ganham, todos querem a sua fatia do bolo. Mas, para mim, o mais importante sãoas vidas dos civis, os cidadãos, as crianças, as famílias destruídas, a fome, a devastação. A guerra na Síria é uma questão humanitária nossa, de todos, do mundo. Sabemos da importância de voltarmos com o Salamaleque agora, embora o espetáculo fale da memória de uma família síria, provocamos a reflexão sobre o momento atual. Tenho parentes lá, em Yabroud, que estão em segurança, graças a Deus. Espero e rezo para que em breve acabe tudo isso.

NR - Tem acompanhado as campanhas de apoio aos refugiados? Qual a sua opinião sobre a receptividade dos brasileiros para com eles?
VA - Tenho contato com as instituições para as quais vamos encaminhar os itens arrecadados na temporada: Oásis Solidário, Adus e Centro de Acolhida do imigrante. O Brasil é o país que mais recebe refugiados, não só árabes, como também haitianos, angolanos, africanos. Vejo uma corrente de solidariedade, das pessoas que levam doações, de todos os tipos, na tentativa de aliviar a dor de quem é obrigado a deixar a sua pátria nessas condições, e de encaminhar essas pessoas para refazerem a sua vida no Brasil.

NR - Impossível não se emocionar com a peça. Lembrei-me de meus bisavós, que chegaram da Itália, Portugal e Espanha. Como é a receptividade das pessoas? A comunidade árabe é a que mais se interessa em prestigiar Salamaleque?
VA - Sempre pensei no Salamaleque como uma reverência aos meus avós Nadime e Nicolau, mas como falei anteriormente, a peça fala da memória afetiva, ligada à infância, que é comum a todos, seja qual for a ascendência. Claro que quem é filho de árabe ou netotem uma identificação imediata, pelos nomes, pela comida, mas constatamos que conseguimos acessar a memória do espectador, seja qual for a sua ascendência. Ontem mesmo recebemos um casal de senhores armênios que disse que aquela história era deles também. Minha maior alegria é quando um judeu diz que o Salamaleque conta também a sua história.

Sobre Valéria Arbex – interpretação e concepção do projeto
Fundou a Cia. Teatral Damasco, em 2010. Integrou a Companhia Círculo dos Comediantes durante oito anos. Sob a direção artística de Marco Antônio Braz, atuou em Perdoa-me por me Traíres; A Falecida; e Figurinha Difícil – perspectiva da obra de Plínio Marcos. É formada pela Escola Profissionalizante de Atores Indac, Escola de Atores Pirandello; iniciou sua formação teatral com o diretor Vladimir Ponchiroli e com a atriz Nilda Maria. Com a Velha Companhia, atuou em Valéria e os Pássaros, de José Sanchis Sinisterra. Na televisão, atuou na série Pedro & Bianca, TV Cultura, sob a direção de Jeferson De e Fábio Mendonça.

SALAMALEQUE segue sua temporada no Instituto Cultural Capobianco - Teatro da Memória. Projeto Terceira Margem III. ENTRADA GRATUITA. Sábado ás 16h00 e 20h00 / Domingo ás 16h00. Realização Cia Teatral Damasco / Tel 11 97499 4243. Até 12/03. .Distribuição de ingressos 1 hora antes. Rua Álvaro de Carvalho, 97. Próximo ao metrô Anhangabaú. NÃO HAVERÁ APRESENTAÇÃO NO CARNAVAL.

O Capobianco receberá doações em prol dos refugiados no Brasil nos dias de espetáculo. Os donativos serão encaminhados às seguintes instituições:
1. ADUS - Instituto de Reintegração do Refugiado no Brasil – Recebe material escolar - caneta, lápis, caderno, livros infantis;
2. Oasis Solidário – Alimentos, fraldas, trigo, farinha de trigo, lentilha, grão-de-bico;
3. Centro de Acolhida ao Imigrante – Todos os tipos de doações.

Ficha Técnica
Idealização do projeto: Valéria Arbex.
Realização e Coordenação Artística: Cia.Teatral Damasco.
Direção: Denise Weinberg e Kiko Marques.
Dramaturgia: Alejandra Sampaio e Kiko Marques.
Atriz: Valéria Arbex.
Cenografia e figurinos: Chris Aizner.
Trilha sonora original: Sami Bordokan.
Iluminação: Guilherme Bonfanti.
Consultoria gastronômica: Graziela Scorvo Tavares.
Cenotécnico: Mateus Fiorentino.
Produção: Carol Vidotti, Rosana Maris e Melissa Rudalov.
Assessoria de imprensa: Fernanda Teixeira / Arteplural.
Projeto gráfico e ilustrações: Aida Cassiano. Glossário árabe / português: Mamede Jarouche.
Operação de som e luz: Fernanda Guedella, Adriana Dham e Ricardo Barbosa (stand-in).


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